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Dark Souls III é um ponto final claro pra "Souls". Segue a lógica celebratória mas mórbida de Metal Gear Solid 4, as histórias importam, mas é hora de criar outras narrativas "pintar um novo mundo", é tempo de dizer adeus. Entretanto, justamente por celebrar esse legado, Dark Souls III não consegue se distanciar de >Dark Souls<, pelo contrário, talvez a maior reclamação de quem não gosta tanto do jogo é que ele se esconde demais nas asas do clássico de 2011.

Pelo menos desde 2009, a From Software tá contando em seus "souls" uma história sobre ciclos, e o fardo da vida. Demon's Souls, Dark Souls 1/2/3 e Bloodborne, todos eles tem uma interpretação distinta desse tema, mas eu acho muito significativa a abordagem de Sekiro, principalmente considerando que é a culminação de literalmente uma década desse tipo de jogo e, por consequência, desse tipo de história.

Ashina tá em guerra, ideais e poderes colidindo no inevitável fatalismo do campo de batalha. Sua missão é tirar o Kuro dali (um adolescente que não conhece nada do mundo fora o que diz respeito a sua própria linhagem), e seu principal antagonista é Genichiro, o maior soldado ativo de Ashina, que anseia pela imortalidade do dragão pra salvar seu território dessa guerra. "Território", porque o Genichiro não se importa de verdade com o povo que vive ali, ele é fanático pela história e as tradições de Ashina, é a cultura que salvou ele, o avô dele é um gigante cultural que representa tudo isso, se Ashina morre, ele morre.

O ciclo em Sekiro (2019) é a imortalidade que, por sua vez, vêm diretamente das águas habitadas por um dragão. O dragão, além de mais antigo que todo mundo ali, brande a Moonlight Greatsword, que simboliza não só "Souls", mas a própria From Software como existência. E quem tem que carregar o fardo da vida nesse jogo é todo mundo que entra em contato com essa imortalidade; claro que o Lobo é literalmente o portador, mas as pessoas em volta dele começam a ficar mais e mais doentes toda vez que ele morre e volta à vida.

Você quer tirar o Kuro dali, o Kuro quer acabar com a imortalidade, e o Genichiro quer esse poder pra ele. Pra dar um fim na imortalidade você precisa machucar o dragão, e pra tirar o Kuro de Ashina você precisa não só derrotar o Genichiro (que nesse contexto literalmente cria uma lógica de battle shonen não apenas em sua presença como rival, mas também por ser a luta mandatória de visões de mundo se chocando), como também banir Isshin Ashina pro além, e cortar a imortalidade dele pela raiz.

Genichiro é um reacionário por definição mesmo, o último esforço dele pra manter o status quo é reviver o avô morto, que é uma figura nacionalista mitológica. Se o jogo o tempo todo tava dizendo pra fugir desse conservadorismo tóxico que vem com tradições maléficas, aqui é escancarado de vez. Pro Kuro viver a própria vida e o Lobo -que passa o jogo todo em crise de personalidade, indeciso a quem dedicar sua lealdade- reafirmar sua presença naquele mundo como um agente livre das vontades dos outros, é necessário matar as tradições.

Como o próprio Isshin diz toda vez que ele te mata "Hesitação leva a falha". Sekiro (2019) não é Souls, e pra isso ele precisa tomar riscos. Não pode existir hesitação quando seu objetivo é se distanciar de uma década de padrões. É uma batalha difícil, você vai perder várias e várias vezes até conseguir, mas a mensagem que aparece depois disso é "Imortalidade Rompida".

O que mais me intriga é que o Isshin na verdade não é imortal de forma literal, mas como diria Dr. Hiluluk "um homem só morre quando é esquecido". A imortalidade rompida não é da pessoa, mas sim da ideia. Tudo tem de ser passageiro, assim como é a flor de cerejeira.