Eu duvido que com um título como esse, Blasphemous passe a ideia de ser um jogo muito sensível ao tópico religioso e, de fato, ele não o é.

Blasphemous me parece, à primeira vista, um jogo que quer tratar de uma mensagem e usa a gameplay para levar o jogador a ver e ouví-la, não se contentando em fazer isso apenas uma vez, mas duas ou mais, visto que o final verdadeiro requer que o jogador se dedique intimamente à jornada do penitente sem nome e sem voz.

Narrativamente, este é um jogo que requer certa atenção ao que é dito, além de se beneficiar de um jogador mais atento aos detalhes visuais. A história, porém, ainda não é exatamente clara e suspeito que a tentativa de criar uma religião fictícia (com uma inspiração um tanto óbvia) tenha prejudicado em alguma medida a capacidade do jogo de ser compreensível. A falta de clareza, combinada à imagética que pode ser facilmente associada a algo que os jogadores terão, minimamente, um conhecimento superficial sobre, ajudam a construir a onipresente sensação de desconforto que o jogo provoca (ou tenta provocar).

Visualmente, Blasphemous é um jogo grotesco, abusando do body horror, com bastante violência e sofrimento explícito e implícito. Entretanto, como disse, o jogo abusa desse recurso e, depois de algum tempo, parece que toda aquela violência eventualmente só serve o propósito de chocar o máximo possível; O que é uma pena, considerando que o jogo faz muitas referências culturais e históricas que poderiam ter sido melhor exploradas se os desenvolvedores (um grupo massivamente latino/hispânico) de fato tornassem algumas delas mais explícitas.
Um exemplo disso é uma quest opcional que envolve recolher os restos mortais despedaçados de uma mulher e entregá-la a uma igreja, fazendo alusão a uma prática da Inquisição que, fazendo o mesmo, afirmava que ao separar as partes do corpo, a alma dos hereges seria impedida de alcançar a paz na morte.

Há de ficar claro que este não é um jogo que faz apologia a uma determinada religião, mas que usa de sua fictícia para denunciar a apatia e crueldade vistas na história humana nas diferentes formas de perseguição religiosa, aqui, presumo, com ênfase na Inquisição Espanhola.

Por fim, antes de comentar os pontos negativos, faço uma menção honrosa à trilha sonora desse jogo que faz um trabalho impecável em ambientação e consegue contribuir muito bem ao ambiente opressivo e de sofrimento do jogo.

Blasphemous é um jogo com muito sofrimento para distribuir e dessa distribuição nem mesmo o jogador escapa.

A começar pelas armas e progressão de personagem, limitadas fortemente pelo enredo do jogo, todo o jogo se baseia em um combate com uma única espada e algumas variações de golpes e combos.
Todo o combate do jogo se resume a partir pra cima dos inimigos e tentar acertá-los com força e velocidade e, mesmo que o jogo nos dê algumas opções de golpes à distância, somos prejudicados pelo level design que dificulta ou inviabiliza estratégias do tipo.
Além da movimentação padrão, o jogo nos fornece um dash limitado ao chão e uma habilidade de parar (e contra-atacar) golpes de inimigos.

Apesar de ser “vendido” como um jogo rápido, a impaciência e imprecisão são constantemente punidas pelo jogo, do cenário aos chefes, tudo implica em realizar ações bem pensadas ou sofrer as consequências. Felizmente, o jogo dá aos jogadores mais persistentes um bom arsenal de equipamentos para ajudar a resistir aos diferentes tipos de dano, o que não torna a experiência frustrante apenas porque sim.

Outra ferida aberta neste jogo são seus inimigos que, embora sejam conceitualmente interessantes, são uma mistura de inimigos trolls ou inimigos indiferentes, com o cansativo efeito de "toque da morte" (causam dano por mero contato, mesmo sem atacar). Bosses são uma feliz exceção a parte desses problemas e geralmente oferecem um bom desafio.

O que torna parte da experiência em algo francamente exaustivo é que o gameplay se torna repetitivo e, pra quem joga por longas sessões, torna-se frustrante com certa rapidez, uma vez que os defeitos começam a ofuscar as qualidades do jogo e no fim, é provável que você apenas queira terminar o jogo (só pra descobrir que terá de fazer tudo de novo).

Blasphemous é um jogo que testa sua resiliência e te faz um penitente tal qual seu personagem controlado. Felizmente, não poderia dizer que jogar é uma Summa Blasphemia, mas se pensas em ir até o fim com este jogo, prepare-se para Exemplaris Excomunicationis.

Reviewed on Dec 07, 2022


1 Comment


1 year ago

Eu:
- Nossa, ninguém explica Blasphemous direito.

Gabe:
- SEGURA MINHA ESPADA!!!!