"Thieves in the night rob you blind
With surgical precision
You can't evade the eye in the sky
He got facial recognition
Paranoia on every street
It's hard to stay alive
Never know when you'll feel the heat
Before it takes your life"
[Too Much, Too Young, Too Fast - Airbourne]

Esse simples trecho serve bem para introduzir qualquer jogador que deseja se aventurar em Homefront: The Revolution.
Problemático e inconsistente são apenas alguns dos adjetivos que posso usar pra descrever os problemas que este jogo possui e que ficam expostos ao longo da jogatina.
Permita-me resumir as informações apresentadas no prólogo do jogo e então, descreverei alguns dos problemas que atormentaram minha experiência e me fizeram amargar o tempo gasto em Homefront.

A princípio, muito me atraiu a ideia de um jogo 'what if' no qual os EUA não apenas perderam o seu "estrelismo mundial", como também caíram em desgraça por suas campanhas militares predatórias e custosas. Depois de vender o país e a alma a Coreia do Norte por peças de tecnologia e armamento, o país é, literalmente, tomado pelos coreanos com a justificativa de uma missão humanitária uma vez que sua dívida quebrou a nação inteira.
Nossa história começa 4 anos após estes eventos, em uma Filadélfia dominada por um regime militar que agora toma os recursos do país enquanto abusa de seus cidadãos.
Tomando o controle de Ethan Brady, um dos mais novos recrutas da Resistência armada, temos o povo, um líder carismático e armas tecnológicas.
Tudo que resta é dar início à revolução...

Feito o preâmbulo acima, a narrativa se encarrega rapidamente de tirar do palco o líder da Resistência e nos dá controle do protagonista (Brady) e, na minha opinião, comete seu primeiro erro.

Ao longo de toda a campanha principal, Brady não diz uma única palavra e com seu silêncio que consente, é levado do início ao fim do jogo carregando as responsabilidades que, não fosse a aparente falta de hierarquia da resistência, o tornam mais importante que o líder que deu vida ao movimento.
Não demora muito até que o enredo comece a levantar questões envolvendo os sacrifícios necessários para a revolução e se os líderes dela estão realmente dispostos a pagar o preço.
Nosso protagonista, entretanto, quando questionado diretamente sobre as consequências de suas ações, apenas não responde enquanto os outros 3 membros responsáveis pela organização da resistência em Filadélfia tomam decisões que poderiam (e talvez deveriam) ser influenciadas pela opinião do homem que deixa um rastro de sangue por onde passa, quer seja o sangue dele, dos inimigos ou dos inocentes que não sabem o que fazer em meio à rebelião.
A passividade crônica de Brady gradualmente gera uma sensação crescente de desconforto em mim, pois, com seu silêncio sepulcral, o protagonista aceita ser o causador de incontáveis mortes e imensurável destruição, tudo enquanto deixa outros decidirem os rumos de suas ações sem que ele, aparentemente, dê um único segundo de seu tempo para refletir sobre o rumo da Resistência.
Embora nas DLCs paralelas à campanha principal o protagonista passe a ser dublado, sua personalidade se torna escrita em pedra e suas ações, de fato, parecem ter sido ignoradas pelos roteiristas que dão continuidade aos 3 episódios extras que narram os eventos que antecedem e finalizam a história contada em Homefront.

Existem outros problemas inerentes à narrativa do jogo e, dentre eles, pesa bastante o fato de que o algoz da Resistência praticamente não é desenvolvido, pelo contrário, passamos praticamente todo o jogo reagindo aos abusos dos 'Norcs' e não conhecemos líderes, motivações, nem qualquer outra coisa que nos faça dar importância aos homens e mulheres contra os quais nos rebelamos.

Homefront é um jogo de tiro com perspectiva em primeira pessoa que, a princípio, tem uma base para sua gameplay que eu achei interessante, mas, e aqui nasce o segundo problema, tem uma execução que faz as boas ideias se despedaçarem e, para mim, tornaram cada momento de combate em um pequeno inferno.

Existem dois destaques a respeito da gameplay que quero descrever e que servem para expor os problemas dela: as armas e os inimigos.

Por razões narrativas, nosso arsenal é limitado ao que a Resistência pôde arrancar de seus inimigos e com ajuda de seu mago das armas, modificar cada uma para ajudar os guerrilheiros.
Com essa justificativa, a primeira boa ideia de gameplay é dada: armas customizáveis e conversíveis.
Com exceção de uma, todas as armas primárias usadas pelo jogador podem ser convertidas em alguma outra e todas elas podem ser modificadas em campo em pelo menos um aspecto.
A segunda boa ideia de gameplay está no fato de que os inimigos, o Exército do Povo Coreano (EPC), têm equipamentos superiores aos da resistência e não têm medo de usar de sua tecnologia pra oprimir e eliminar os revolucionários. A Resistência, então, terá de lidar com inimigos bem resistentes. Ok, isso foi péssimo
Infelizmente, Homefront faz um péssimo trabalho em unir essas duas boas ideias de uma maneira coesa e orgânica.

Primeiramente, neste jogo não há um retículo no centro da tela que nos permite acertar nossos inimigos de uma maneira menos precisa, porém rápida, forçando o jogador a usar a mira da arma ou alguma mira adicionada a ela.
Para suprir essa necessidade, o jogador pode escolher por adicionar uma modificação à arma que, quando disponível, adiciona um laser que se estende pela tela e dá, muito porcamente, uma ideia de onde nosso próximo tiro pode acertar.
As miras adicionais, que deveriam nos permitir acertar os inimigos mais facilmente, têm, por outro lado, uma limitação: elas possuem um zoom fixo.
Isto significa que se utilizarmos uma mira com um zoom muito alto, dada a animação relativamente longa de transição para mira manual, nosso alvo terá tempo suficiente para se mover para fora do alcance de nosso campo de visão e nos atacar.
Caso a sorte nos favoreça e sejamos capazes de acertar algum inimigo, outro problema surge: o dano de nossas armas é baixo.
Não foram poucas as vezes em que eu descarreguei um pente inteiro da arma que estava usando e meu alvo simplesmente não morria.
Na dificuldade mais alta (a qual joguei), a quantidade de tiros diretamente na cabeça necessários para matar um inimigo variava de 1 à inacreditáveis 9 balas (todas no mesmo ponto) para eliminar um único alvo, havendo a distância como um fator que fazia o dano flutuar de maneira errática.
À medida que isso se repetia, inclusive com armas com dano maximizado, fui percebendo que o jogo levou um pouco longe demais a ideia de ter um desbalanço entre o poder dado ao jogador e aos inimigos. Há algo perturbador em ver inimigos sendo capazes de ignorar tiros à queima roupa disparados a menos de 5 metros deles.
Adicionalmente, devo ressaltar que o aspecto de stealth do jogo é terrivelmente prejudicado pelos problemas acima, uma vez que é praticamente impossível assassinar um inimigo silenciosamente sem que seja necessário estar perigosamente próximo a eles ou por meio de um assassinato furtivo à faca, que por sua parte tem uma animação que é variável e, via de regra, prejudicialmente longa.
O problema da furtividade se torna ainda mais profundo quando, por uma escolha de game design muito duvidosa, o jogador descobre que é absolutamente impossível usar um rifle de assalto ou precisão com um silenciador.

Com tudo isso dito, vemos que as armas na mão da resistência podem ser tão úteis quanto a programação permitir. Porém, isso é apenas parcialmente verdade, pois, talvez intencionalmente, talvez por acidente, vemos durante a gameplay que os demais soldados da Resistência são ridiculamente vulneráveis a EPC. Um único soldado básico da EPC, quando o jogador não está detectado (e logo, não está envolvido em combate), é capaz de eliminar entre 3 e 4 soldados da resistência com facilidade e eu posso atribuir isso à duas razões: a IA dos aliados do jogador é burra, sem "meias palavras"; e também porque os inimigos são privilegiados dentro do jogo para manter uma sensação de dificuldade.

A Inteligência Artificial da Resistência é rasa, é ineficiente, é pífia. Todo combate que eu testemunhei sem que eu influenciasse diretamente seguia uma rotina que pode ser resumida por duas coisas:
— Mal posicionamento:
Não raramente os soldados se movimentavam muito e sempre que faziam era para uma posição desprotegida que normalmente garantia que dois ou mais inimigos poderiam simplesmente atirar neles sem dó.
— Inatividade:
Quando não escolhiam péssimos locais pra ficarem parados, os soldados decidiam se movimentar demais, muitas vezes ficando travados em seu pathfinding e correndo contra paredes ou contra inimigos, quase nunca atirando e, quando atiravam, erravam boa parte dos tiros. Foi bem irritante ver um sniper com seu laser exatamente na posição do inimigo sem atirar. Repetidamente.

Quando o jogador é introduzido na equação, a IA dos aliados se torna ainda mais problemática e escancara uma escolha de game design tão ruim que me surpreende que tenha durado até o lançamento do jogo.
Veja, neste jogo todos os 'atores' com exceção do protagonista são como objetos sólidos que não podem ser, sob qualquer circunstância, empurrados ou deslocados. Em gameplay, isso significa que se o jogador escolher recrutar soldados pra ajudá-lo em combate e se deslocar até um espaço fechado, a menos que os NPCs decidam sair do caminho, o jogador estará trancado naquele espaço.
Por mais vezes do que esperava, tive de matar meus próprios aliados porque eles bloqueavam o caminho de uma porta ou me impediam de alcançar algum objeto ou plataforma.
Quando o jogador entra em combate, estão valendo as regras da IA para quando eles precisam se defender sozinho, mas outros problemas são criados juntos. O primeiro deles é que os soldados da Resistência não são capazes de detectar quando o jogador está em modo stealth, o que significa que se eles decidirem entrar em combate e algum inimigo se mover até eles, o jogador será exposto e atacado.

Se a Resistência é ineficiente, a EPC é eficiente até demais.
Com uma mira quase perfeita, uma movimentação inteligente e a onipresença em campo, os soldados coreanos já representam uma ameaça sozinhos. Una isso ao fato de que eles raramente serão encontrados sem um drone capaz reconhecimento facial ou um veículo armado e você terá inimigos formidáveis te esperando para atacar a qualquer momento. Se você escapar da vista deles por tempo o suficiente, não se preocupe, uma aeronave da EPC estará nos céus pronta pra vigiar o jogador e soar um alarme que aciona um pequeno exército pra te atacar com tudo que eles têm (tudo, mesmo).

Se até aqui não consegui te convencer que os Norcs têm vantagens em excesso contra o jogador, então me permita falar sobre algumas peculiaridades que notei enquanto tentava sobreviver em Homefront.
Primeiramente, saiba que o jogo vai, esporadicamente, spawnar um pequeno grupo de inimigos perto de você (o que normalmente inclui um drone pra denunciar sua posição). Alternadamente e às vezes simultaneamente, a aeronave que denuncia sua posição ficará rondando sua posição pra te forçar a ir em direção a um grupo de inimigos ou, no mínimo, arriscar ser detectado.
Enquanto eu fiquei perdido em uma área procurando um item, percebi que a aeronave tende a circular a área que você está com mais frequência, em vez de se movimentar em uma rota fixa ou aleatória.
Quando não é possível escapar do olhar dos Norcs, tentar se esconder em locais fechados nem sempre é uma boa ideia, pois a IA pode, de alguma forma, arremessar uma granada em uma posição quase perfeitamente próxima a você.
E claro, a pior parte, os soldados da EPC podem ser spawnados em zonas conquistadas onde, supostamente, a resistência deveria estar patrulhando. Às vezes, eles aparecem literalmente após uma conquista, como se nunca tivessem sido expulsos.
Eu não brinco quando digo que estes desgraçados parecem ter sido tão mal programados que eu tive o desprazer de encontrar um soldado em um segmento de uma missão onde ele simplesmente NÃO PODIA SPAWNAR e o infeliz quase me matou.

Tendo em vista que o core loop do jogo te força a estar constantemente engajando lutas por território contra esses inimigos, trata-se de lutar, correr ou morrer (e no meu caso, as últimas opções foram as mais frequentes).

Ignorando o purgatório que é o gameplay, temos um jogo que me pareceu visualmente competente e que, apesar do level design atrapalhar a IA mais do que qualquer coisa, há cenários que demonstram bem o ambiente desolado da guerra civil travada.
Sonoramente o jogo é bem "8 ou 80". As músicas são decentes e servem bem para determinar o tom de uma cena ou mesmo do combate. O som em alguns diálogos tende a ser cortado se o jogador decide sair dos "trilhos" definidos pelo jogo, mas normalmente isso só acontece em segmentos onde há uma influência pesada de personagens finamente controlados pelo script.
A única ressalva que faço é que depois de um bom tempo preso no loop da morte que é o combate, é provável que se você, assim como eu, não entende nada de coreano, comece a interpretar mal os soldados da EPC e ouça coisas como soldados gritando: "Fudê! Fudê!"
Eu fiquei perplexo me perguntando por que diabos os shocktroopers pareciam estar tendo um orgasmo todas as vezes que me viam ou ainda porque eles pareciam estar com tanta raiva pra atirar (talvez eles queriam que o jogo acabasse).

Honestamente, a experiência de jogar Homefront: The Revolution não é uma sem diversão, mas se você decidir jogar, jogue no fácil sem nenhum medo. Você estará poupando sua sanidade e provavelmente vai se divertir mais do que eu consegui.

E se você leu até aqui, deixo meu agradecimento! 😄

Reviewed on Jan 28, 2023


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