A primeira impressão que se tem ao assistir qualquer trailer ou apresentação de PARANORMASIGHT é que se trata de um mistério de terror e suspense, o que já inquieta o coração de muitos jogadores menos corajosos (eu incluso). Mas essa impressão não se mantém por muito tempo.

O jogo tem a temática com pé no horror sim, pois trata de maldições e fenômenos sobrenaturais, mas seu núcleo mesmo é de mistério policial, com bastante investigação e situações problema baseadas em lógica e exploração. Não há um design voltado para criar tensão e antecipações para sustos como em muitos jogos de terror, muito pelo contrário. A trilha sonora está sempre auxiliando a aliviar a tensão e deixar o clima mais leve e descontraído, por vezes.

PARANORMASIGHT então é essa proposta com temática fortemente inspirada em superstições, histórias de fantasma e ocultismo, dando cor a uma investigação criminal envolvendo eventos recentes ao entorno de um ritual sobrenatural que está afetando a região de Sumida, em Tóquio e sim, há diversos elementos reais misturados com a ficção.

A apresentação do jogo tem um ar bastante teatral, com um narrador dando início à aventura similar a um apresentador circense que introduz ao jogador os primeiros conceitos e a premissa da história. De cara já sabemos que a trama se passa por volta dos anos 80, com o surgimento das primeiras TVs coloridas.

Nos cenários que visitaremos, podemos ver outros elementos que caracterizam a época, como o uniforme de colegiais, o estilo de corte de cabelo de alguns personagens, além de outros elementos da moda local do período, sem esquecer de outros eletrodomésticos antigos como o telefone de disco e a máquinas de fax.

Toda essa ambientação e design artístico são ilustrados com uma belíssima direção de arte, com uma personalidade marcante que foge bastante do padrão de jogos com visual de anime. Do traço ao figurino, não só os personagens tem um impecável trabalho de design, quanto os cenários são trabalhados pra funcionar com uma mistura homogênea de 2D e 3D.

Aqui nós vemos a utilização de uma fusão de cenários e personagens que usam técnicas modernas e criativas para fazer a animação individual e também para a exploração dos ambientes. É algo que agrega diretamente ao gameplay, criando uma sensação de imersão de destaque particular que lembra o uso de capacetes de realidade virtual, em virtude da perspectiva em primeira pessoa.

Essa imersão trabalha diretamente com a edição empregada nas cenas de diálogo, que em conjunto com a direção de fotografia cria uma narrativa constantemente dinâmica e que evita bastante o posicionamento estático comum em títulos de adventure japonês mais antigos, brincando com diversos ângulos de câmera, composições que se alternam sobrepondo elementos alternadamente e outros truques como panning e zoom, comumente utilizados em vídeos de Youtube.

Isso só é possível graças a essa fusão perfeita do 2D com o 3D. É como se todos os ambientes fossem um cenário tridimensional com shaders e filtros que misturam perfeitamente os modelos e o cenário dando um aspecto homogêneo impressionante. Mas isso é um truque, já que os cenários são ilustrações estáticas que se beneficiam do movimento da câmera pra dar essa ilusão de ambiente virtual.

A câmera pivota em torno de si mesma, sempre na perspectiva de um dos personagens, apesar de nem sempre permitir o alcance total de movimento de 360º, já que a limitação se faz necessária na composição de cenas específicas.

Eu peço desculpas, mas não vou entrar em detalhes sobre o roteiro e a narrativa. É que eu sinto que revelar certas características pode estragar sua experiência com o jogo e é muito importante que você saiba tão somente a premissa. Até mesmo a estrutura da narrativa contém surpresas que vale a pena descobrir por si mesmo.

O que posso dizer sem risco de spoiler é que há uma constante e fluida sequência de seções de cutscenes e de controle da personagem, seguindo algumas convenções do gênero, como necessidade de conversar com os personagens, usar itens específicos, investigar alguns pontos de interesse e exaurir opções para seguir em frente. E quase sempre que há a necessidade de resolver enigmas ou solucionar situações problemas não existe uma transição forçada para um “espaço de solução de puzzle” como alguns jogos. O mais comum é interagir diretamente com o cenário na maioria das vezes, salvo alguns momentos mais…fora da caixa.

Ainda sobre elementos de gameplay, é maravilhoso como o design integra todos os elementos do jogo, tanto diegéticos como os não diegéticos. Em alguns momentos se faz necessário o uso de mouse ou teclado para inserir respostas ou clicar em pontos específicos do cenário, o que não enfrenta problemas ao ser adaptado tanto para o gameplay em PC, no gamepad do Switch ou nas telas de toque nos celulares.

O orçamento do jogo admite sua humildade, em especial a falta de atuação de voz e a reutilização de poses e animações, o que não impede do time bolar soluções criativas pelas quais muitos jogos indies recebem elogio e reconhecimento, e tampouco deixar de caprichar no que o título faz de melhor: seu roteiro e diálogos, sua edição e fotografia, seus efeitos e trilha sonora e seu design geral como jogo.

Sem dúvidas PARANORMASIGHT é um dos melhores adventures que já joguei. Lidar com lendas urbanas, interagir com personagens cheios de personalidade e solucionar alguns quebra-cabeças bastante criativos me fizeram sorrir de satisfação com a engenhosidade por trás deles. Se o título principal para “Os Sete Mistérios de Honjo” de fato pretende se tornar uma nova franquia da Square, então que venham mais jogos. Enquanto isso, vou me deliciando com a trilha sonora.

Reviewed on Mar 21, 2023


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