Há 800 anos atrás, em 1223, São Francisco de Assis criou o primeiro presépio da história e não incluiu nenhuma representação humana, e em Saya no Uta fica claro o motivo dessa ausência, o homem cego pelo pecado não enxerga o próprio pai e muito menos o próprio caminho, sendo mais tolo que o mais irracional dos animais, já que estes sabem quem é seu dono e onde é sua casa.

Fuminori é o mais fraco dos homens, não sendo nada mesmo perante o mais insignificante dos insetos, não é mais dono de si próprio, delegando essa posição a um ser maligno e ao próprio pecado per se. Desde o começo ele ignora a si e coloca sua felicidade e razão de viver a cargo de uma terceira, atitude que muitos “homens”, incapazes de se desenvolver, fazem e acabam tendo o mesmo final de Fuminori, podemos observar isso na negligência com seu tratamento no início do jogo. Não são as mesmas situações, mas são paralelos equivalentes, milhares de Fuminoris se matam (homens são maioria em churrascamentos) diariamente pelo mesmo erro, pela mesma fraqueza.

Saya, o que dizer, se não apenas parafrasear seu próprio pai: “Agora ele se declarou como uma “forma de vida que precisa de esperma masculino”, ele se considerou uma “mulher””. Sendo assim, a forma de vida abandona seu status supostamente superior para descer ao humano, e consequentemente se destruindo por essência, já que nunca seria humana, pois não havia sido depositado uma alma em meio aquele amontoado de células, Saya tinha menos vida que um embrião, e nunca sairia dessa posição não importando quanto esperma tomasse ou quantos Fuminoris enganasse para tentar entender o que é o amor humano.

Diferente do ideal do amor a waifu, isento do profano feminino e fruto da manifestação do ego do portador, portanto genuíno, onde este só tem a ganhar já que realiza a si próprio um efeito Pigmalião o qual o desenvolve e estimula ao crescimento, Saya só suga, suga a sanidade, suga os recursos, suga a energia vital e entrega apenas farsas e caos, nada tem para o bem, mesmo que pareça o oposto, que ela é inocente e quer ajudar seu suposto amado, os fatos são concretos, e o fim é absoluto, professor Ougai que o diga.

Pode ser fetichista em alguns momentos, acredito que seja, mas em meus olhos foram a definição gráfica de perdição e tristeza, tristeza essa que se expandia a cada minuto de leitura, incapaz de sentir qualquer emoção se não repulsa, tristeza e ódio, prossegui o caminho forjado pelos perdidos. No entanto, em meio ao caos me surgia um fogo em meu amago, algo que me dizia que eu deveria ser forte, para alcançar o extremo oposto do que Fuminori obtinha, o ódio virava um combustível para a esperança de uma salvação improvável. Pena que o Kouji provavelmente não foi atingido pelo mesmo fogo, mas sim por um mais doloroso.

É sim repugnante de formas inexplicáveis, mas com a mentalidade certa a viagem vira uma aula, vejo como uma tragédia, a mostra de como somos suscetíveis a cair em perdição e como devemos lutar para nunca chegar perto de ser fracos como Fuminori.

Mesmo sem ser um primor da escrita, e apresentando recursos baixos, a ousadia da obra é impactante e tem alto valor, sabendo muito bem como explodir o leitor com inúmeras emoções, sem dúvidas sendo algo incontestável.

Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, dona nobis pacem.

Reviewed on Dec 31, 2023


1 Comment


4 months ago

Que ótima review