O termo Power creep é muito estranho, não é?

Enquanto jogava Devil May Cry 2, me perguntei o que me faz sentir mais poderoso em um jogo: destruir tudo com um golpe ou precisar de uma série de golpes, mas ser capaz de executar qualquer golpe que quiser?

Eu sou uma pessoa que ama se sentir estupidamente poderosa nos jogos, vindo de jogos RPG onde, geralmente, se você é muito forte MESMO, consegue limpar tudo com uma bola de fogo, um golpe da espada lendária ou um monstrinho de nível muito alto. Eu aprendi que isso é ser poderoso.

Jogando DMC 2, me senti mais poderoso do que em muitos hack 'n' slash.

Mas senti uma grande diferença no estilo de jogo do DMC 1 e do 2. Neste, eu priorizo o uso das pistolas a todo momento, isso começou assim que percebi o quão legais elas são e também o quão PODEROSAS elas pareciam ser (2 minutos de jogo). Claro que a gameplay não me permitia tanta variação quanto combos do DMC 1, mas eu me apeguei à sensação de poder.

DMC 2 poderia fazer jus à infame frase: 'Dada a oportunidade, jogadores irão otimizar a diversão do jogo.' Nós priorizamos a otimização no lugar da diversão e acredito que para muita gente esse foi o caso em DMC 2, mas a otimização desse jogo me fez gostar dele ainda mais. Pode parecer impossível, mas focar em atirar apenas me deixou em um flow delicioso onde eu precisava dominar o timing dos inimigos para esquivar, pular e encontrar aberturas para usar o Devil Trigger.

Isso, inclusive, me lembra Dark Souls 2, e se você me acompanha talvez saiba que eu gosto muito de jogos não rápidos, que exigem timing e paciência. DMC 2 foi um pouco disso. (Sei também que os paralelos entre DMC 2 e DS 2 vão ainda mais distantes, amo a fantasia dos dois jogos e DMC 2 é incrivelmente fantástico em sua direção artística)

Mas claro, se fosse apenas um jogo quebrado, não teria meu apelo tão pessoal, acontece que eu gosto de DMC 2 pelos mesmos motivos de amar o DMC 1: DANTE.

DANTE ESTÁ AQUI.

DMC 2 traz uma perspectiva mais sombria de um futuro Dante que talvez tenha vivido outros traumas além daqueles vividos no primeiro jogo. E apesar de suas fraquezas estarem ainda mais tímidas, esse é um Dante que transborda ainda mais ternura e compaixão, só que dessa vez coberto não por uma casca adolescentemente implacável, mas com uma maturidade que o torna ainda mais o devil hunter que amei no primeiro jogo, um composto paradoxal de sisudez e maciez.

Enquanto no primeiro jogo vemos um Dante cheio de potencial, mas em uma jornada de crescimento, aqui temos o Dante que já chegou no seu ápice e agora nada mais parece ser um desafio. Temos um Dante cansado e eu amei isso. Amei principalmente porque foge do estereótipo que esperamos de um personagem edgy desse jeito, não é uma depressão soturna e melancólica, mas um estado de espírito de quem já passou por muito, mas que ainda tem espaço para contemplação, compaixão e esperança. Dante está pronto para passar seu legado.

Então, de fato, Dante é poderoso e implacável contra qualquer inimigo, sacar a espada nem é mais necessário, suas pistolas dão conta de todo inimigo patético e megalomaníaco que aparece no seu caminho. Mas aqui existe uma suavidade que é apresentada em primeiro momento no motif narrativo. Existe algo tão Dante quanto exterminar uma mega corporação de demônios para ouvir histórias sobre seu pai?

Ao finalizar o jogo com Dante, terminamos sem saber seu destino. Ele parece destemido e determinado, mas também tem um melancólico ar de despedida quando as cortinas se fecham

Então, só nos resta a campanha de uma personagem que cresce Dante ainda mais, contrapondo-o em muitos aspectos, mas também adornando-o tematicamente.

Lucia: Nascida de um berço amaldiçoado como demônio, foi abraçada como anjo por uma mãe que a fez crescer acreditando ser a humana que salvaria seus iguais. Os paralelos com DAntes começam aqui, mas vão muito além.

Das cores inversas, poderes angelicais e a relação familiar funcional, Lucia entrega um contraste que ergue ainda mais Dante nesse jogo. Pois a expertise de Dante não é apenas refletida em suas eficazes e espertas soluções, mas também na sua relação com Lucia, que possui um paralelo claro com o acontecimento do primeiro jogo e com Trish. Mas dessa vez Dante demonstra uma maturidade tal que envolve Lucia de esperança e compaixão. É linda, apesar de curta, a relação fraternal dos dois nesse jogo.

Enquanto jogar com Dante é jogar poderosamente, jogar com Lucia me permitiu jogar bem, fazendo combos, esquivas e, apesar de limitada, tive a sensação de que podia fazer muito mais do que com Dante.

E foi assim que percebi que não sinto tanta graça em jogar bem.

Não poder atirar em tudo o que vejo não deixou a gameplay massante (mesmo porque os dois discos passam muito rápido para mim), mas me tirou um brilho que senti no disco 1 quando o power creep desaparece. Mas, por outro lado, isso abrilhanta ainda mais essa experiência. Faz todo sentido não ser overpower com a Lucia, ela está na posição que Dante estava no DMC 1, existe muito espaço para melhoria, inclusive me vi mais tentado a upar espadas com ela pois percebi que talvez fosse mais efetivo.

E em sua jornada de emancipação (tal qual Dante do primeiro jogo) veremos um desenvolvimento e descobertas pessoais que resultam em um final ainda mais íntimo e cheio de ternura quando entendemos que o motivo de Dante fazer tudo aquilo não era dinheiro, sorte ou até ouvir histórias de seu pai, mas essa compaixão e bondade que Dante tem por entender que já viu e viveu tudo aquilo que Lucia está vivendo. Dante cresceu, e apesar de ser muito confundido com soturnidade, Dante aqui é um epítome de maturidade.

"-Não quer ouvir sobre seu pai?"
Responde Dante em despedida, prestes a entrar em um portal para o inferno:
"-Não preciso, eu sei que ele faria o mesmo."
Não vemos mais o Dante a partir daqui.

A sensação desse jogo me remete ao final do Dragon Ball Z e até GT, um ar de despedida com conexões às origens da obra. Fez-me pensar o quão mágico seria passar por todos os jogos e depois finalizar neste aqui, uma cápsula do que amei no DMC até agora, com paralelos claros ao primeiro jogo, mas com uma maturidade e sobriedade dignas de um adeus terno e acolhedor dessa franquia.

Não é o caso, pois vou jogar o DMC3 e espero que consiga encontrar esse Dante novamente.

Reviewed on Sep 09, 2023


15 Comments


8 months ago

ahh, fico feliz que tenha gostado, breno. quando terminei o dmc 2 fui ver o que o pessoal falava dele no youtube e eu nao poderia ter ficado mais decepcionado. mais pareceu que todo mundo queria ter seu video falando o porque dmc 2 ser ruim e procedendo a descrever uma checklist de qualidade tecnica que o jogo nao cumpre; conteudo facil

eu infelizmente nao consegui me conectar tanto com dmc 2, adoraria que fosse um guilty pleasure ou qualquer outro termo idiota. seus pontos abordados no texto sao os que justamente me fizeram nao desgostar do jogo por completo e dar valor a tudo que ele fez de melhor. lembro que tentei conversar com algumas pessoas sobre as coisas que gostei nele, mas foi a mesma coisa que falar com a parede 😢

aguardando o texto do dmc 3!

8 months ago

qual seria o contexto do termo power creep aqui? achei que so se aplicasse à jogos online

8 months ago

Medo do que tu vai achar em dmc 3

8 months ago

@Gaba_ Entao, to vendo que o hate online [e muito grande msm, sabia uqe n era o favorito, masn imagina que os fãs de dmc odiavam tanto o jogo hahah Pois é! acabei me conectando tambem por estar em um momento bem dificl de jogar e esse jogo ser curtiho e me entregar esses temas me confortou

8 months ago

@Lenz Fiz uma apropriação desse termo mesmo, Geralmente caracteriza o aumento esponencial de poder em jogos multiplayer gerlamente, concorda? mas acredito que podemos faze ruma tranposição para a sensação de personagem super poderoso por estar claramente a frente do seu momento. É como se Dante estivesse super avançado, mas jogando o tutorial kkkk

8 months ago

@Weltschermzz Eu to curtindo! enfrentei o Virgil agora e to interessado nessa relação deles!
Dante adolescente ´eum pouco chatinho, mas acho que faz parte, consigo ver ainda ele eventualmente se tornando o do 1 e depois o do 2. ACHO QUE ELE TA AQUI Ainda haushuas vamo ver! EU n sou muito apegado a mecanicas entao algumas setpieces tao meio chatas, mas num geral ta ok!

8 months ago

Relação incesto família sacana

8 months ago

"revisionismo", "guilty pleasure" (nada a ver com o uso do Gaba do termo ali), termos que confirmam o quanto a conversa sobre videogame ainda tá condenada às verdades do bem-fazer técnico e o quanto as pessoas estão desinteressadas em opiniões diferentes, e sim nos choques, nos movimentos, nos embates

ninguém quer saber de Devil May Cry 2, só de quem tá certo ou não por gostar do jogo ou não. que tragédia
parabéns pelo texto Breno

8 months ago

@YSTMaster KKKK maldito

8 months ago

@totolecc pse, não existe culpa alguma ne? cara, eu só gostei e isso parece importar mais para muita gente do que até msm p mim kkkKkk Teve gente brincando, mas teve gente falando sério e isso me deixa triste. Não por questões pessoais, mas por esses fatores que mencionou.
Mas seguimos, vamos construindo esse caminho, valeu queridoS2

8 months ago

Eu comprei a coletânea DMC HD + DmC em 2016 no X360 (tudo por uns R$15, bons tempos) e planejava jogar todos direto que nem tu tá fazendo. Após o primeiro e o reboot, fui pro 2 e fiquei empacado no tédio que sentia e dei uma pausa de meses, o que obviamente me deixa surpreso com a sua opinião!

Eu sou do time que se sente mais poderoso com "precisar de uma série de golpes, mas ser capaz de executar qualquer golpe que quiser" e mesmo eu detestando o quão eu otimizo os jogos, DMC é a única franquia que eu consigo dizer que faço o oposto, pra mim é quase um sandbox de combate, logo, fica bem claro o motivo de eu não gostar. Eu também não gosto muito desse Dante mais sério, apesar de achar que esse jogo tem umas das melhores frases de efeito dele. Eu não aguentei jogar a campanha da Lucia e ver todo aquele cenário marrom vômito mais uma vez, mesmo percebendo que ela realmente era melhor.

Mas você demonstrou o oposto: se sentiu poderoso com as pistolas, gostou desse Dante, jogou com a Lucia e percebeu que não vê tanta graça em jogar bem.

Minha reação normal seria "Nossa, como assim ele gostou disso??", mas ao entender essas coisas, ela foi "Nossa, que bom que ele gostou disso! :D". Abriu meus olhos, talvez até mesmo pra motivos de eu curtir jogos que eu curto e os outros não.

PS: Adoro a customização do Devil Trigger, a corrida na parede e mesmo detestando a história (e todo o resto) acho uma injustiça o que fizeram com ele na cronologia.


8 months ago

Relendo aqui e você não tinha o DIREITO de fazer uma resenha tão bonita e chocante sobre DEVIL MAY CRY 2.
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Aqui vão spoilers de Devil May Cry 2 e outras mídias, como o Mangá
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Falando nessas ligações de dores e histórias que só quem passou entende, no caso, o Dante sobre a Lucia, acho interessante citar que a Lucia estende esse conceito de "família" que resume Devil May Cry. Se Dante tem grande parte de seus conflitos relacionados a um laço de sangue, Lucia tem um conflito muito semelhante, mas parte de sua história é que sua família de verdade, a Matier (a velha) e até seu amigo Dante, não tem qualquer tipo de laço sanguíneo além de suas histórias; Interessante uma abordagem oposta ao ligamento imposto de Dante sobre suas tradições e linhagem serem colocados tão próximos de uma personagem tão parecida, mas com processos tão diferentes.
/=/ Um dos climax da Lucia é descobrir que era adotada por Matier e seu único parente de verdade era Arius, no caso, seu criador. (eu não soube muito bem em que ordem colocar essa parte, então só arrastei aqui para baixo)

[Devil May Cry, a esse ponto, por suas ordens caóticas e tantas mídias diferentes, lhe permite escolher a ordem cronológica dos acontecimentos, e até mesmo, ignorar o que você quiser; Eu não gosto que no futuro, em outras mídias, o Dante é colocado como paixonite da Lucia, eu real gosto mais da camaradagem]

Acredito que família é um conceito muito extenso e acho muito interessante como todo Devil May Cry gosta de testar os limites desse conceito.

8 months ago

@noventaporcento eu fico muito feliz com esse seu texto :)) sua reação ao eu ter gostado e entendido meu ponto me deixa muito feliz namoral! E eu entendo1000000% seu ponto e os motivos que levam alguem a n gostar, mas fico feliz que voce entendeu meu ponto!
Novamente, VALEU DEMAIS PELA RECOMENDAÇÃO

8 months ago

@ZakVi po que FODA! POis é! Ela contrapõe o dante em vários ponto, inclusive esse, po concordo demais!
Valeuzão queridoS2

8 months ago

:D