O que fazer quando se engana a morte e o destino?
Buscar vingança? Buscar respostas? Virar o jogo?
Pra essas perguntas, Fallout: New Vegas (FNV) oferece uma resposta e o faz de uma maneira que te induz a ficar firme no assento, aguardando pelo próximo momento.

FNV vê os problemas de seu antecessor e os corrige, melhora ou elimina. Tudo enquanto adiciona os próprios, é claro.
Se em Fallout 3 as Perks exageravam e davam poder em excesso ao jogador, aqui, todas dentro dos 88 totais que podem ser escolhidas têm seu lugar e sentido sem quebrar o equilíbrio. Se o V.A.T.S. parecia (e era) desequilibrado, FNV faz bem em garantir que o abuso da mira assistida vai ter suas consequências (como o doloroso delay entre as ações, por exemplo). E quando digo que problemas foram adicionados, eu não poderia deixar de citar os famigerados bugs que continuam vindo em todas as formas possíveis, embora aqui FNV tenha sido salvo (quase unicamente, eu ressalto) pela sua base de modders dedicados a dar estabilidade ao game.

Portanto, se o resto dessa review agora pode existir, eu dedico o resto dela à galera que dedicou seu tempo pra fazer o possível pra tornar Fallout New Vegas um jogo que todos podem jogar, do início ao fim, com o mínimo de frustração possível

Com a observação acima feita, eu quero deixar claro que para mim, Fallout New Vegas é um diamante bruto.
Como um jogo "as is", isto é, do jeito que vem, inalterado, eu poderia dizer que o jogo se aperfeiçoa à medida que avançamos, finalmente alcançando a grandeza em seu clímax.

Toda a parte de combate do jogo eventualmente se torna uma repetição viciada para descobrir quão a melhor chance de acerto que obtemos no V.A.T.S., escolhendo qual arma melhor satisfaz essa necessidade.
Isso não é exatamente novidade pra quem conhece os jogos anteriores, desde o início. Todavia, muitas vezes eu me encontrei em situações em que abusar desse recurso era a única forma de garantir minha sobrevivência e, mesmo assim, não era a mais confiável, especialmente à curta distância.
Infelizmente, em quesito de combate, FNV me pareceu uma corrida para eu me tornar o melhor sniper do deserto Mojave, mesmo que isso não implicasse em de fato usar rifles de precisão na maior parte do tempo. Felizmente, a variedade de armas disponíveis faz bem em remediar a repetição incessante.

A ambientação em FNV me surpreendeu por não se sustentar em composições de cenário macabras (acentuadas pelo filtro de cor) como era em FO3, pelo contrário, a natureza hostil e o animal mais perigoso dela fazem bem o trabalho de oprimir o jogador. Por outro lado, quando o jogo decide apostar nisso, especialmente em suas DLCs, o efeito é muito mais forte do que seria se isso fosse o 'lugar comum' do jogo. E claro, as coisas que podemos pressupor por contexto ou implicação continuam a contribuir nisso.

Fallout New Vegas tem ótimas músicas, isso eu não posso negar, uma pena que a maior parte delas não estava nas radios do jogo.
É claro que eu amo ouvir alguns clássicos como "Why Don't You Do it Right" ou "Orange Colored Sky", mas há algo na escolha das músicas nesse jogo que inevitavelmente me cansa de ouvi-las mais rapidamente do que eu normalmente esperaria em um jogo.
De fato, o achado musical do jogo está nas várias missões secundárias que, quando não são referenciadas diretamente pelo título, são referenciadas por sua letra inspirando os eventos da missão.
"Don't Make a Beggar Out of Me", "That Lucky Old Sun" e "Come Fly With Me" são apenas alguns exemplos de boas músicas que podem passar despercebidas facilmente tal qual as numerosas referências religiosas podiam em Fallout 3.

A história de FNV não é a minha preferida da série, mas admiro a habilidade dos roteiristas ao tratar um enredo com um forte viés político, dando bastante flexibilidade ao jogador de escolher a quem servir no impasse pelo controle do Colorado.
Descrever os lados dessa disputa por si só já seria um spoiler maior do que estou disposto a dar, então, me satisfaço em dizer que pode ser interessante pôr em prática o hábito de interpretar o personagem em nossas mãos e tentar enxergar esse mundo alaranjado pelos olhos dele ou dela.
Apesar de existirem muitas "fetch-quests" no jogo, a maioria das missões secundárias vale o esforço investido e, fazendo menção ao que disse sobre as músicas, são nelas, especialmente, onde encontramos as referências mais interessantes.
Infelizmente, e isso foi um dos meus maiores dissabores com o jogo, as DLCs narrativas de New Vegas me soaram, na maior parte do tempo, como fillers cruéis pra inflar o tempo de jogo.
Ironicamente, minha insatisfação com elas aumentou junto do nível sugerido para iniciar cada uma, então, prefiro dizer algumas coisas sobre cada uma nessa mesma ordem.

Observação: Quando joguei as DLCs, eu já estava pelo nível 30-50, isto é, estava por volta dos limites que cada uma aumentava ao ser instalada (30 sendo o limite do jogo base). Por isso, vou me eximir de comentar profundamente sobre o gameplay, uma vez que tudo estava escalado pra se adequar ao meu nível e quaisquer comentários podem ser muito imprecisos

Honest Hearts é a primeira DLC a nos dar mais contexto sobre os atores envolvidos na narrativa principal, também mostrando que mesmo que o imperialismo americano não tendo alcançado regiões mais remotas da Terra devastada, outra coisa chegou e cabe ao Courier decidir o que fazer com isso e com o povo presente. Essa DLC "conversa" muito bem com o modo hardcore do game e, diferente das demais, sabe gastar o tempo do jogador e, apesar de também esconder o contexto da narrativa e forçar a exploração, o faz de maneira generosa e que dificilmente vai gerar frustração.
De maneira geral, é uma experiência honesta, que entretém e oferece o bastante pra justificar sua existência. Ressalto, também, que a ambientação focada na natureza é excelente e vale a pena parar pra observar a paisagem vez ou outra.

Old World Blues foi a próxima e, para mim, ela foi o gatilho que me fez acreditar que as DLCs iriam começar a abusar do gameplay para fazer o jogador procurar por migalhas de contexto enquanto explorava o mapa. Esta é uma DLC excêntrica, cuja ambientação e contexto atrelado funcionam bem em conjunção. É nela que o cinismo em relação à vida humana que faz cada protagonista parecer um sociopata atinge o ápice no game e, de alguma forma, isso enriquece a história, na minha opinião.
Embora o jogador possa jogar qualquer uma das DLCs a qualquer momento, eu acredito que seja indispensável jogá-la antes das duas próximas pode ajudar a entender melhor o contexto e personagens delas. Dizer muito mais do que isso envolve spoilers, então, vamos à próxima.

Dead Money foi uma DLC relâmpago para mim, pois tão logo a iniciei, quis também sair. A premissa para justificar gameplay é interessante e desafiadora, mas o level design e a IA dos nossos companheiros tornaram a minha experiência com essa DLC um inferno pessoal. O fato de ter perdido meu progresso repetidamente com bugs inerentes ao motor de jogo também foi decisivo nisso.
Todavia, mais uma vez me vejo na obrigação de elogiar a ambientação que, aqui, fez de Sierra Madre um lugar vivo e que te ameaça de mais maneiras do que inicialmente pode parecer.

Lonesome Road, na minha opinião, teria sido excelente se sua experiência tivesse sido um pouco mais "on rails" e menos "explore toda parte e torça pra encontrar um fragmento de contexto por aí". A ambientação faz um excelente trabalho em passar a impressão de um ambiente desolador e solitário, remediado apenas pela presença de um único companheiro que, apesar de não ter falas inteligíveis, demonstra um carisma que me cativou.
Lonesome Road faz um convite à contemplação solitária e, bem como seu antagonista, guarda o melhor até fim.
É uma boa experiência, mas que requer muita paciência e um olho atento.

Fallout New Vegas é diferente.
É o melhor da série?
Eu não acho, mas é decididamente um jogo que vale o tempo investido e nos compensa com sua unicidade.
Assim como o Courier está sempre levando algo, o jogo também está constantemente nos trazendo algo, basta decidirmos o quê.

Reviewed on Jan 17, 2023


3 Comments


1 year ago

Belo texto mano! FNV é um dos jogos que estão na minha lista pra rejogar algum dia, ainda mais pelo fato de eu não ter jogado as DLCs. Eu achei ele anos luz melhor que o 3, não sei se o fato de ter jogado o FNV primeiro influenciou nisso, mas achei a comparação entre ambos até injusta.
Valeu, @Hunyoshi!
É um pouco injusta, mas é um tanto inevitável.
Por mais meme que possa parecer, Fallout 3 andou pra New Vegas poder correr e eu não pude negar que havia muita coisa no 3 que poderia melhorar e melhorou em NV.
Ficou fora do texto final, mas existem muitas comparações entre FNV e FO4 que eu gostaria de fazer, mas preferi deixar pra quando eu escrever sobre o FO4 propriamente.

1 year ago

Provavelmente é o Fallout que eu mais tenho vontade de jogar... Mas e aquele medo de jogar na versão crua, sem mods nem nada? XD