De maneira objetiva, nada é exatamente "único", nós gostamos de replicar aquilo que nos apetece, é natural que desenvolvedores apaixonados queiram fazer jogos que gostariam de jogar e muitas das vezes são tantas as inspirações que nós paramos de ver as similaridades e encaramos como algo novo. Há casos onde o oposto acontece e a mistureba se sobressai como só uma grande recombinação sem sentido.

Pra ser breve e coerente vou usar The Legend of Zelda como exemplo e imaginemos que um fã esteja diante de uma penca de "Zelda-likes" no mesmo volume de Metroidvanias...
Jogadores querem sentir o que gostaram de sentir jogando Zelda mas eles não querem sentir que estão jogando Zelda, talvez não saibam a diferença de imediato mas é o que separa um clone de uma releitura.

Tunic é essa releitura e ele não mascara nem por um segundo que vai ser um Zelda que você pode comprar na Steam. Combate baseado em espada e escudo, grande ênfase em exploração e descoberta, chefes, dungeons, tesouros e até mesmo o visual é uma pintura moderna dos clássicos de NES.

De maneira superficial, Tunic é tipo Zelda, e é inegável o esforço que foi feito para oferecer um pouco mais do que já é tão familiar: Z-targetting e movimento analógico são melhorias que os Zelda 2D nunca viram e aqui foi perfeitamente implementado; a corrida, a barra de stamina, parry, Tunic ostenta diversas das melhorias da série assim como a sua própria reimaginação do sistema de progressão, um tom "RPG" que a princípio soa problemático mas traz uma nova satisfação a exploração.

O game tem idéias novas o suficiente pra se valer como um jogo de ação e aventura mais do que competente, mas não é pra celebrar as diferenças que eu escrevi essa análise.

Tunic é inegavelmente um refinamento da fórmula, é crível que nada no NES pode competir com seu visual, seu combate ou seu level design, mas mesmo tendo quase 40 anos de aprendizado de vantagem, o principal mérito de Tunic é um que ele só divide com jogos tão velhos, que é o seu manual de instruções.

Ao longo da aventura o jogador vai coletando páginas do manual para o jogo e é lendo o manual e transcrevendo seus segredos que o caminho adiante se revela, pra saber efeitos de itens, compreender a história e até mesmo se localizar no mundo o jogador precisa parar e ler. O quão louco alguém tem que ser pra montar uma experiência como essa hoje em dia? Eu só posso agradecer pelo time da Finji por ter essa coragem.

Diversos jogos hoje em dia tentam melhorar Zelda ou simplesmente replicar Zelda, tirando a "parte ruim" e colocando algo novo no lugar mas Tunic, apesar de toda a sua pompa, teve humildade para não tratar o game design "velho" do Zelda original como um defeito, na realidade o jogo inteiro se baseia nesse apelo e não faz mais que comemorar os esquecidos manuais de videogames.

Mais do que qualquer Zelda moderno, Tunic oferece a alegria de realmente desvendar um mundo, de interpretar sua expressão não verbal e mergulhar numa aventura onde não se sabe o que vai encontrar e isso tudo ele deve ao estilo de game design mais velho da história da Nintendo e um que ninguém parecia sentir falta. Eu amo como Tunic presta homenagem sem parecer que quer suceder sua inspiração ou cair na "mesmísse", é o exemplo perfeito de rebuscar um sentimento de criança sem apelar pra uma nostalgia nociva.

Reviewed on Oct 07, 2022


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