Veredito: bonito e íntimo pra caralho, e janky até o talo.

Já digo logo que sou suspeito pra falar de Sable. Eu curto demais cel-shade, adoro jogos contemplativos, sou platinador por natureza e tenho uma queda ENORME por histórias sobre amadurecimento e sobre a chegada da vida adulta. Sable tem tudo isso, ele mira em cheio nos meus pontos fracos. Então talvez seja prudente você ler esta análise com um pé atrás. O que eu falar corre altos riscos de ser tendencioso pra caralho, e muito diferente do que vai ser quando você jogar.

Também tenho uma tolerância meio exagerada a "defeitos técnicos". Sable é recheado deles: a colisão é estranha, a câmera é uma merda, a taxa de quadros não pára quieta um minuto (tá tudo fluindo bem e aí do nada você tá jogando uma apresentação do Powerpoint, e vice-versa) e a física é toda esquisita. Tudo é bugado demais, defeituoso demais, os controles nem sempre obedecem, parece que nada funciona direito.

Mas é nessas horas que eu dou graças pela minha tolerância a isso. Faltou sim uma testagem e uma programação mais caprichadas. Mas sobrou visão artística e carinho dos criadores pela obra.

Você é Sable, uma adolescente dos nômades Ibex, um dos muitos clãs do planeta desértico de Midden. Seguindo o costume do seu clã, você está prestes a começar a "plainagem", o Avoo, um rito de passagem para largar a infância pra trás e entrar na adultisse. Você deixará seu lar, família e amigos e vai viajar o mundo conhecendo todos os lugares que puder, todos os costumes que quiser, todos os conhecimentos e sabedorias que couberem na sua maturidade. A partir daí... você é livre pra ir aonde seu coração desejar.

Sable não tem combate. Não existe barra de vida, não tem o medo de dar game over e precisar voltar. Só existe a exploração, e o mundo a ser conhecido. Midden é enorme e tudo é um deserto, mas não falta variedade e beleza. Das paisagens salinas e abandonadas dos Lixões Sódicos ao oásis perto da metrópole de Eccria, passando por cavernas de insetos luminosos e um ninho de um besouro gigante, existe muita coisa pra se ver. Os cartógrafos, isolados em seus balões, são mais do que vendedores de mapas: eles são personagens próprios, com personalidades próprias, que te contam histórias sobre o que tem de interessante nessa ou naquela região, e pra isso você precisa achar algum caminho até o lugar alto onde eles se encontram.

Essa é a essência da jogabilidade de Sable: explorar o mundo e conhecer os personagens. Tudo é uma missãozinha no menu, tudo é fazer favores para outras pessoas em troca de recompensas: resgatar Fulano que machucou o pé e ficou preso, interrogar suspeitos e achar um culpado pela sabotagem do sistema de energia, brincar com um grupo de crianças, pegar tal coisa em tal lugar e levar para Beltrano. Nem dá pra esconder a influência descarada de Zelda Breath of the Wild: escalar, planar, barra de stamina, viagens longas.

Mas ao contrário do se espera dos jogos de mundo aberto, todas as quests voltam ao ponto central do jogo: descobrir seu lugar no mundo. Encontrar sua vocação. Aproveitar a jornada. Descobrir que tipo de ser humano você quer ser.

Alguma hora o seu Avoo vai ter que acabar, alguma hora você vai ter que concluir o rito de passagem e voltar ao seu clã como mulher adulta. Você pode pedir ajuda, orientação, fazer perguntas, mas não dá pra prolongar para sempre a busca pelas respostas. E tudo bem. Nenhuma adulta tem todas as respostas, ninguém vira uma pessoa 100% sábia e crescida só porque deixou a infância pra trás. Você não precisa ser a primeira.

Sable não é um jogo sobre o quanto os adultos são sempre maduros e responsáveis. Não é sobre ganhar algum tipo de conhecimento fodão que as crianças e adolescentes não têm. É sobre uma jornada íntima, pessoal e intransferível que todos nós fazemos. E é sobre entender que isso é normal. Crescer é normal, conhecer pessoas diferentes e expandir a nossa visão de mundo é normal, sair do ninho é normal. Pode até parecer solitário, assustador e perigoso, e algumas vezes é mesmo. Mas enquanto você estiver seguindo seu próprio caminho - mesmo que não tenha certeza dele, mesmo que se sinta insegura - você está no caminho certo. Você pode errar, você pode mudar de rumo, você pode se arrepender. Tudo bem, isso faz parte da vida. Não importa qual caminho você escolhe. O que importa é que seja seu.

Reviewed on Nov 16, 2023


24 Comments


5 months ago

Cara... Se esse jogo tivesse doido lançado redondinho ele séria um espetáculo... No lançamento ele tá pior do que tá agora... E não acho que Ele deva melhorar, infelizmente.

5 months ago

@Simply_OverB Tu jogou no lançamento? Caraca, tu é muito guerreiro. XD

"Não é defeito, é charme."
- Raw Fury, provavelmente.

5 months ago

@CDX Eu lançou Day One no Gamepass, aí eu tinha pego ele pra testar... Tava complicado a parada. Eu até podia dar um alívio pq grande parte de sable foi feito por 2 pessoas... Mas tipo Hollow Knight, e principalmente Chained Echoes existe, Chained foi feito por um cara só.

5 months ago

@Simply_OverB No início também dei essa colher de chá pelo estúdio ser só 2 pessoas. Mas aí vi os créditos e lá diz que a Raw Fury, a Amber e outras deram a maior força com testagem, design, programação, etc. Ou pelo menos deveriam ter dado. =P

https://www.youtube.com/watch?v=U2Zx0W6MfAY

5 months ago

ainda tô pra jogar esse pq parece muito bom de jogar chapado hahahahhah

5 months ago

@CDX Entendi, então a crítica pode ser um pouco mais dura, pq eles deveriam ter visto como o game tava antes de lançar...

Ah sim outra coisa... Eu achei The Talos Principle II melhor do que o primeiro, que eu já considero um dos melhores da história...

5 months ago

@Simply_OverB MOLEQUE TU NÃO FALA ISSO QUE MEU CORAÇÃO NÃO AGUENTA!!!!!

Devo começar ele esse finde, se Nosso Bom Pai das Especs Mínimas me ajudar. 🤞

5 months ago

Estamos vivendo ou esperando uma review de The Talos Principle II do @CDX?

5 months ago

@CDX Cara, eu não sei se você vai vai achar também, pois sei que a sua conexão com o primeiro game é mais forte do que a minha... Mas a sensação que tiver com o Talos Principle II foi a mesma que tive com Psychonaouts 2 e A Plague Tale Requiem. De tipo, pegar tudo o que o primeiro têm de maravilhoso e expandir pra cada pedaço que o segundo se propõem a fazer, de melhorar cada pedacinho e sensação, sabe...

Eu não sei se você vai sentir o mesmo... Mas pra mim The Talos Principle II é um dos melhores jogos de todos os tempos, tanto que ele rasgou a minha lista de melhores 2023, que é o melhor ano da história dos games na minha análise... Como também rasgou as minha lista de melhores jogos... E já que a empresa se considera Indie, aparentemente, também a de melhores Indies dá história... Achei fantástico de verdade.

5 months ago

@Simply_OverB

POR FAVOR NOSSO BOM PAI DAS ESPECS MÍNIMAS ABENÇOA TEU FILHO NESTA HORA DIFÍCIL!!!!!!!

5 months ago

@CDX Eu verdadeiramente espero que você ame esse jogo, tipo eu torço por isso mesmo... Pois dá pra ver que você amou a primeira jornada, e queria muito ver você amando a segunda como eu também amei... 😁

5 months ago

Ah sim e vale comentar, tem como jogar em terceira pessoa nesse jogo, e sinceramente, eu gostei mais de jogar assim do que jogar em primeira, é uma experiência interessante

5 months ago

@Simply_OverB Ah, mas isso já era esperado. No Talos 1 dava pra fazer isso, seria muito estranho se não desse no 2. XD

5 months ago

@CDX Eu tlgd nisso... Mas tipo assim, por algum motivo, diferente do primeiro game, que a primeira pessoa era a melhor experiência, ao menos pra mim... Nesse segundo, a terceira me deixou muito mais confortável jogando, tem uns takes em terceira nesse jogo que são de tirar o fôlego.

5 months ago

@Simpky_OverB Tu fala isso porque não foi atrás da platina, hahaha

No 1, pegar todas as estrelas e ver todos os easter eggs é BEM MELHOR em 3ª pessoa. XD As partes de plataforma ficam MUITO menos complicadas assim do que em 1ª pessoa.

5 months ago

Nossa, eu poderia facilmente ter escrito essa sua review. Joguei bem próximo do lançamento e mesmo com todos os problemas ele me marcou demais e foi meu GOTY. Foi bem antes de fazer o enem, ainda em dúvida de qual curso seguir, e Sable meio que me falou "tá tudo bem ter dúvidas, siga sua vida porque nada é escrito em pedra" e deixou o processo um pouco menos estressante (além de ter me apresentado Japanese Breakfast que fez a trilha do jogo)

5 months ago

@Belo Se eu gostei pra caralho de Sable, eu que sou adulto feito já com 12 anos de casado e que achei minha vocação há eras, nem imagino o impacto que ele pode ter em quem é adolescente ou acabou de entrar na adultisse.

5 months ago

Pô, tuas reviews são muito boas, vim aqui só pra ver o que tu tinha pra falar do jogo.
Já tô com ele comprado e na lista, mas acho que, diferentemente de como tu enxerga, já bati minha cota de "jogo chato" esse ano (GRIS, Firewatch, Planet of Lana)

5 months ago

Valeu pelo elogio, @acapivarajorge. ❤️

Sem pressa, hahaha, joga ele quando tu estiver preparado pros bugs e pro polimento ruim. XD

4 months ago

quero mt jogar esse jogo ainda. Tlvz eu jogue ano que vem seila

4 months ago

@ximitbaka @Typh Tomara que gostem! =D

3 months ago

Uma das reviews mais sábias de sable, esse jogo é lindo, vou citar alguns de seus trechos mas darei todos os créditos a você!

3 months ago

@KauamSobreira Sem neurose, manda ver! ;-)

Só não esquece que também vi vários defeitos nele, hahaha! XD